domingo, 28 de outubro de 2012

Para pensar os debates

A cada novo pleito eleitoral, deparamo-nos com uma questão antiga que precisa ser revista: a forma de realização dos debates entre candidatos adversários por emissoras de rádio e TV ou mesmo por outras mídias. A atual legislação sobre os debates não define de forma objetiva as regras para sua elaboração e condução, deixando lacunas pelas quais se impõem os interesses dos meios de comunicação e nunca o dos principais interessados: os eleitores. Pelo que versa a lei do debate, as normas devem ser decididas em comum acordo entre os participantes e as emissoras e homologadas pela Justiça Eleitoral. Só que o “comum acordo” transformou-se no acordo possível. Hoje, as empresas de comunicação decidem quase tudo, conforme suas conveniências: do horário da exibição até as perguntas que serão feitas e por quem serão, passando pelo tempo dedicado a cada candidato para responder aos questionamentos. Assim, os candidatos e partidos ou se rendem às imposições, ou perdem a chance de se confrontar e expor suas ideias. Isso quando os veículos não cancelam debates previamente agendados com as coordenações das campanhas, oferecendo explicações nem sempre razoáveis e motivações nada isentas. Esse poder de que se investem as emissoras é absolutamente descabido, já que são concessionários de um serviço público e, portanto, deveriam atender aos interesses da sociedade. Dentre as mudanças necessárias para que os debates cumpram sua função de ajudar o eleitor a comparar propostas e ideias está a reformulação do modelo atual. Hoje, os debates são muitas vezes marcados pelo tédio e pelo engessamento resultantes da grande quantidade de regras e imposições na sua condução, acertadas previamente entre as emissoras e os marqueteiros das campanhas, a fim de evitar perguntas consideradas incômodas ou inconvenientes. Ou então, tem-se o oposto: discussões fora da pauta dos interesses dos cidadãos, colocadas por jornalistas escalados pelas emissoras, as quais em nada enriquecem as discussões. Está muito claro que a organização está nas mãos erradas. A exemplo do que acontece nas eleições americanas, os debates no Brasil precisam ser promovidos por entidades da sociedade civil, pelas universidades e centrais sindicais, com perguntas elaboradas por eleitores e selecionadas por sorteio. É a única maneira de conceber a pluralidade e realizar debates de fato programáticos, em torno de propostas e projetos para as administrações públicas. Também é preciso rever o horário de exibição e determinar que se dê em horário nobre, favorável à audiência, e não mais de acordo com as condicionantes comerciais das emissoras que os transmitem. Nas eleições municipais deste ano, a maioria dos debates realizados, tanto no primeiro, quanto no segundo turno, iniciou-se às 23h, horário pouco convidativo ao público que acorda cedo para o trabalho. O argumento de que não geram audiência é enganoso. Assim como a propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV, os debates são instrumentos importantes para ajudar o eleitor a determinar seu voto. Outra regra que precisa ser modificada é a da “camisa-de-força” do tempo destinado às perguntas, respostas, réplicas e tréplicas, que tanto compromete o aprofundamento dos temas pelos candidatos. Para os próximos pleitos, se quisermos debates realmente propositivos, capazes de enriquecer a disputa eleitoral, precisamos nos mobilizar para promover essas alterações. Não é possível condicionar a realização dos debates aos interesses dos grandes veículos de comunicação, que já impõem um noticiário dirigido e programas jornalísticos claramente tendenciosos, reproduzindo com destaque exagerado episódios de campanha pouco ou nada relevantes para o confronto de ideias. O papel de exigir dos candidatos uma agenda séria, guiada pelas questões relacionadas aos problemas das cidades, dos Estados e da nação, bem como propostas de solução, é, sobretudo, da sociedade. Portanto, é ela que deve ditar as regras do debate político que tem interesse em assistir. 

José Dirceu, 66, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT

Matéria publicada no Sul21